Frieiro, Carvalho.


Os livros, nosso amigos (2007)

Série de ensaios sobre os muitos aspectos do livro incluindo autoria, coleção e cuidados, escritos com muita erudição e espirituosidade.

CAPÍTULO 1
- A arte de amar os livros -
A "necessidade física da leitura. Mulheres e livros. O bibliófilo e seu tesouro de papel impresso. A biblioteca, serralho das belas edições. A editio princeps e a felicidade do bibliólatra. Os glutões de livros. Caricatura do bibliômano. Opinião de livro-velheiro. Arte de amar os livros.

CAPÍTULO 2
- A tectônica da máquina de ler -
Da arte de bem imprimir, a mais amável das artes. O aspecto externo do livro. Arquitetura e arte tipográfica. Paul Valéry e a perfeita máquina de ler. W. Morris, Pelletan e a arquitetura da página [metáfora bonita do livro como arquitetura e da arquitetura como livro]. Typographia inter musas decima. Nobreza dos mestres quinhentistas da arte de imprimir. Decoro profissional. O livro brasileiro.

CAPÍTULO 3
- Ler e reler -
A leitura e a idade. Uma estatística. A bulimia livresca dos moços. A idade madura prefere a qualidade à quantidade. O cansaço e a incuriosidade de homens e ideias. Tratados sobre a arte de ler. A leitura é uma amizade. O homem que le: don Marcelino Menéndez y Pelayo. Autores que repelimos na mocidade e amamos na madureza. Um livro não é o mesmo, lido em diferentes idades. A idade em que apenas se relê. Autores velhos e novos. Opinião de Unamuno. Conselhos do padre Sertillanges. Leiamos o que nos agrada.

CAPÍTULO IV
- A leitura ajuda a viver -
A leitura como prazer. Lista de W. Somerset Maugham: livros que se devem ler por gosto. Literatura e arte. O critério da legibilidade e a questão do gosto.

CAPÍTULO V
Nossos "paraísos artificiais"
A realidade e os devaneios da imaginação. O que dizia a mãe de Flaubert. Os livros não perturbam a mente nem secam o coração. D. Quixote e os livros de cavalarias. Ler e escrever, necessidades vitais. A alexia. A leitura, ce vice impuni. Um ledor famoso: Daniel Huet. Longevidade e persistente apetite de papel impresso.

CAPÍTULO VI
- Livros para poucos e livros para muitos -
Em que consiste o êxito literário? O que pede ao autor. O escritor e o público. Diversidade de públicos. O destino da obra impressa. Na Europa e nos Estados Unidos. Como os norte-americanos lançam livros para o grande público, único que interessa ao comerciante. Mercantilismo e publicidade. Os best sellers. Fama e dinheiro. O reverso da medalha. Aurores que cortejam o grande público e autores que o desprezam. André Gide e Paul Valéry, contemptores do aplauso da multidão. Opinião de Paul Claudel sobre os leitores. É raro na França o grande escritor popular A melhor literatura.

CAPÍTULO VII
- O livro dos livros -
O homem dum só livro. A Bíblia, o "Grande Larousse do povo judeu". O estilo dos escritores ingleses e a leitura cotidiana da Bíblia. Opinião de André Maurois. A frande república americana do Norte: uma demagogia religiosa fundada na Bíblia. William Bryan e a intolerância religiosa. Curiosa mensagem secreta. Cocktail de lendas e superstições da velha Palestina. Voltaire e as Sagradas Escrituras. Valor literário do Velho Testamento. A poesia dos Evangelhos. Bibliomancia [seu uso por Nazistas e seus opositores]. Traduções.

CAPÍTULO VIII
- Doze livros, doze épocas -
Obras que fizeram época - epoch making - no pensamento ocidental. A lista de E. H. Blakeley: livros cuja influência mudou o curso dos acontecimentos humanos. Platão, Aristóteles, Virgílio, Santo Agostinho, Santo Tomás de Aquino, Copérnico, Calvino Locke, Kant, Rousseau, Darwin.

CAPÍTULO IX [*]
- Ler e escrever -
O talento literário, o prazer de ler e o gosto de escrever. Pessoas de gosto literário que nunca escrevem. Escritores que começaram tarde: o padre Benito Feijóo, George Eliot, Sherwood Anderson, Jospeh Conrad. Ainda quando a vida física declina, a espiritual pode continuar em ascensão. A longevidade nos grandes escritores. A vida intelectual: macrobiótica. O tinteiro, fonte de juvência. Evitemos o automatismo mental. Viver para ver; ver para descrever.

CAPÍTULO X
- Bibliófilos, bibliômanos e bibliopiratas -
A autêntica bibliofilia e a mania colecionadora. A paixão das obras antigas, raras ou caras. O amor às belas encadernações. Bibliotecas ou bibliótafos? A libido possidendi. As "onze mil virgens" do cardeal da Cunha. Sêneca e a "moda do livro pelo livro". Zombarias de Luciano e ironias de La Bruyére. Na Idade Média e na Renascença. Bibliotecas e bibliófilos muçulmanos. O Philobiblion. Petrarca, o "pai da bibliofilia moderna". Grolier. O "Roxbourgh Club". O amigo dos livros alheios: o bibliopirata e o biblioclepta. D. Pedro II, bibliopirata? O rapto dum Ribeyrolles [estória divertida de um suposto roubo de livro perpetrado por D. Pedro II, ver ainda sua coleção no v. 152 da RIHGB]. Cuidado com os colecionadores! O affaire Libri.

CAPÍTULO XI
- O encanto dos livros velhos -
A paixão dos livros velhos: princípio da verdadeira bibliofilia. As primeiras edições, os quinhentistas, os aladinos, os clássicos Ad usum Delphini. Leilões de bibliotecas importantes. Repertórios e manuais bibliográficos [lista de obras de referência, vale a pena consultar]. O bibliófilo pobre e a cupidez judaica dos livreiros de segunda mão. Adeus, pechinchas!

CAPÍTULO XII
- Livros curiosos, ridículos e singulares -
Autores excêntricos de livros ridículos. A. Laporte e seu manual crítico e filosófico de livros raros, curiosos e singulares do século XIX. Uma série de volumes licensiosos: L'art de... O Ensayo de D. Bartolomé José Gallardo [bibliógrafo espanhol]. Brochurinhas mofinas, pobremente tipografadas também acham quem as estime [Menciona a substituição da tradição tipográfica portuguesa pela francesa após 1900].

CAPÍTULO XIII
- O verdadeiro bibliófilo -
Uma novela de Charles Nodier: Franciscus Columna. A Hypnerotomachia, ou seja, Pugna de amor em sonho, de Polífilo: Albo corvo rarior.

CAPÍTULO X
- Livros extravagantes -
A bibliotipologia tradicional. De Gutenberg aos nossos dias. Curiosas aberrações. Uma obra impressa em folhas de ouro. Um Dom Quixote de cortiça. O livro impermeável, para ler no banho. Obras nanicas. 1.500 volumes liliputianos numa maleta de viagem numa maleta de viagem. Encadernações macabras, com pele humana. Uma obra encadernada com a pele do autor. Estranhos legados testamentários. A pelica de um "mamífero de luxo". Livros como folhas de aço: previsão de Édison, ainda não realizada.

CAPÍTULO XV
- Os inimigos do livro -
Os anobídeos e outros insetos, os roedores, a umidade, o pó, o mau papel. Os inimigos mais temíveis: o caruncho e o cupim. - Outros inimigos: os filantes, os bibliocleptas, o mau leitor, a guilhotina dos encadernadores. - As bibliotecas públicas e a educação do leitor.

CAPÍTULO XVI
- Contra os livros -
Don Diego de Torres Villarroel, filho de livreiro, professor e escritor, fala mal dos livros, próprios e alheios [interessante]. Outros detratores. Contra a maré montante das obras impressas e o excesso de literatura. Opiniões de Sêneca, Berkeley, Schopenhauer, Nietzsche, Tolstoi. Literatos que nunca leem, ou só leem a si próprios. O direito e o avesso duma velha sentença. Cada leitor tem os livros que merece [leitores asnáticos para autores asnáticos].

CAPÍTULO XVII
- Das infinitas variedades de filantes -
Aforismo de Leite de Vasconcelos sobre empréstimos de livros. Não empreste! - Livro emprestado é livro estragado ou livro perdido. Um dístico célebre. - A bibliopirataria e os traficantes de preciosidades bibliográficas. Camilo e o incuncábulo Tirant lo Blanch. - As bibliotecas monásticas medievais e os rapinantes. Libri catenati. Ex-libris. - O autor e os filantes. Mais esperta que G. B. Shaw. Manuel Gálvez e um admirador... gratuito. Caradurismo e tenacidade dos pedinchões.

CAPÍTULO XVIII
- Prestígio e desprestígio das dedicatórias -
Apreço às dedicatórias dos autores estimados. Filado e com dedicatória. Isca comercial. Dedicatórias esparramadas, engenhosas, agudas, espirituais. A. de Baudelaire a Théophile Gautier. As sóbrias e incisivas. Valor comercial e estima e subestima literária. Uma anedota de G. B. Shaw. Outra sobre A. Gide. Laconismo aconselhável. Lição de Machado de Assis.

CAPÍTULO XIX
- A patologia do livro -
Insetos nocivos. A ação da luz e os efeitos da umidade e da poeira. A péssima qualidade do papel mecânico. Papéis de boa qualidade, papéis caros. O livro atual, pouco durável. Clínica de livros. Um Instituto de Patologia do Livro. Cuidados e remédios para prolongar a vida dos livros.

CAPÍTULO XX
- A bibliátrica -
Arte de restaurar livros que sofrem as "injúrias do tempo" e outras injúrias. Cirurgia plástica para recompor textos, vinhetas e encadernações. Arte especial e delicada. Como se prolonga a vida dos cimélios.

CAPÍTULO XXI
- Ex-líbris -
Antes de nada, um problema de grafia: ex-libris, ex libris ou exlibris? E outro de pronúncia: ecss-líbris ou êis-libris? A moda dos ex-líbris. A Confraria dos Pré-Rafaelitas. Germano Neves e Correia Dias. O ex-líbris não é marca de autor. De Dührer e Holbein a Max Klinger e Hans Thomas. Ex-líbris-dedicatórias. Colecionadores e permutadores. No Brasil e em Portugal.

CAPÍTULO XXII [*]
- Tristeza e alegria do bibliófilo pobre -
A peregrinação diária pelos lugares de perdição. Quanto mais caros os livros, mais fascinantes. Melancolia do bibliófilo pobre. O vício do homem "impresso". Rimbaud e a tolice literária. Contra os livros. Retratação.

CAPÍTULO XXIII
- O diabo nas tipografias -
O erro tipográfico ultraja o texto e humilha o autor. Uma exceção à regra geral: as "rosas de Malherbe". Teófilo Braga e o "canto de ledino" [crítica ao método "imaginador e teorizador" de Braga]. Os erros de ortografia, as trocas de palavras, a edição, a omissão ou a publicação de letras. Lapsos engraçados, inconvenientes ou desastrosos. Quem se imprime se oprime [atual lei de Gaiman]. O Diabo anda solto nas tipografias.

CAPÍTULO XXIV
- Ainda o diabo nas tipografias -
A gralha e o pastel. Pedro II e o tipógrafo-mor. Antônio Torres e os gatos. Erros tipográficos inocentes que deram dor de cabeça ao autor d'Os Sertões. A condessa Noailles e um leitor. A velha queixa contra a incorreção dos textos literários. A importância da função do revisor. Na idade de ouro da Tipografia. Conselhos dum bibliófilo catalão.

CAPÍTULO XXV
- O escritor e as provas -
Fantasmas que tiram o sono do escritor. Corrigir provas: prazer e tormento. Euclides da Cunha e a primeira edição d'Os Sertões. A pressa e os jornais errados. As seis provas de Renan e as oito de Anatole France. A "laboriosa felicidade". Eça de Queirós, Proust, James Joyce. Escrever é só uma metade, a outra é corrigir.

CAPÍTULO XXVI
- Santo Eça, mártir das tipografias -
O trabalho de Eça de Queirós sobre as provas tipográficas. A luta do escritor com editores e impressores. As vicissitudes e contrariedades da primeira impressão de Os Maias. Contínuas refundições do romancista e protestos do tipógrafo. Lamentações angustiosas de Eça, em cartas a Ramalho [ver mais na biografia de Lopes de Oliveira].

CAPÍTULO XXVII
- Corrigir provas -
Como deve organizar-se um bom serviço de revisão. Conselhos duma publicação inglesa. Nos tempos heroicos da Tipografia: o exemplo dos Manúcios, dos Estiennes, dos Gourmont, dos Plantin-Moretus. Revisores eruditos. O "olho tipográfico". A difícil escolha dum bom revisor. Vacilações ortográficas. A cacografia dominante.

CAPÍTULO XXVIII
- A indumentária do livro -
A brochura, a encadernação e a cartonagem. O livro inglês e o francês. Um palpite filológico. A encadernação individual. Pró e contra a encadernação. A encadernação de luxo. Uma advertência de Lesné.

CAPÍTULO XXIX
- Lapsos, disparates, bernardices -
Erros mais graves que os dos compositores: os lapsos, deslizes e tolices dos autores. Não há escritor impecável. O sottisier de Voltaire. A Americana de Mencken. Agripino Grieco e suas aventuras de pescador de pérolas. O dossier de la bêtise humaine, de Flaubert. Disparates de escritores célebres. Asneiras, sim, mas ditas com engenho e arte.

CAPÍTULO XXX
- Escritores impressores -
Um poeta que "compõe" seus versos: Altolaguirre. Uma mulher letrada que imprime. O hobby de Virgínia Woolf. A imprensa Elzeveriana do historiador José Toríbio Medina. O poeta Herreros imprime e vende os próprios versos. A norma de G. B. Shaw. A Oficina Arbuterana, de Horace Walpole. A história da arte de imprimir é um capítulo da história literária. Cristóvão Plantin, protótipo do grande mestre impressor e erudito literário. Jean Grave. Pablo Iglesias. Péguy. Tomás Brandão. Rétif de la Bretonne.

CAPÍTULO XXXI
- Títulos de livros -
A estratégia dos títulos. Que é preciso para que o título conquiste o leitor comum. A palavra pecado e a palavra amor. Títulos breves e títulos extensos. Títulos estranhos, ridículos e estrambóticos. Titular é uma arte.

CAPÍTULO XXXII
- A letra é sagrada -
Delicadeza dos chins. Honrai o papel que contém letras! Uma velha lenda. Como um monge escriba, relapso e pecador alcançou a clemência divina.

CAPÍTULO XXXIII
- Toda palavra impressa é um monumento a Gutenberg -
A prioridade da descoberta da imprensa. Três teses que a reivindicam: a alemã, a holandesa e a francesa. O quincentenário da invenção de Gutenberg. As grandes invenções e a hora mais propícia. A Tipografia, "obra própria da divindade".


Os livros nossos amigos, de Eduardo Frieiro: breve história editorial. (2012)
  • Este artigo se propõe a acompanhar as seis edições conhecidas (1941, 1945, 1957, 1980, 1999 e 2007) procurando detectar as alterações de uma edição à outra motivadas, pelo menos no que se refere às quatro primeiras, pela grande preocupação de Frieiro em aperfeiçoar sem descanso o seu trabalho intelectual, somada à sua intolerância com o livro mal editado. O eixo condutor dessa leitura situa-se dentro das possibilidades da bibliografia histórica e da sociologia de textos discutidas por MACKENZIE (1986), na medida em que esses campos de estudos se preocupam com o rastreio de um texto através das diferentes edições em que foi dado a público com ênfase no seu aspecto material e enquanto testemunho documental o que, de certa forma, difere da crítica textual com seu método rigoroso de estudo e classificação dos textos e das edições, e, em casos especiais, a averiguação da sua autenticidade e a fundamentada identificação de textos apócrifos e de edições fraudulentas. (p. 202-3)
  • A primeira edição dessa “conversa sobre livros” saiu em maio de 1941 pela Livraria Editôra Paulo Bluhm de Belo Horizonte. Para Frieiro, como para grande parte dos escritores mineiros das três primeiras décadas do século XX, acostumados a editar seus livros às próprias expensas, com tiragens reduzidíssimas e distribuição precária, ser publicado por uma editora comercial representava uma novidade. Não que nosso autor desconhecesse a dinâmica da edição moderna definida por critérios intelectuais, técnicos e comerciais. Ao contrário, tinha grande interesse pelo tema sobre o qual lia e pesquisava, além da experiência de mais de trinta anos na Imprensa Oficial de Minas, onde começou a trabalhar ainda criança como aprendiz de tipógrafo e aposentou-se como redator. Lá atuou sempre com o esmero e o cuidado de quem acredita, como Mckenzie (1986), que forma e conteúdo interagem na apreensão dos sentidos através da palavra escrita. Amava os livros como “perfeitas máquinas de ler” e desfrutava do prazer estético de ser o escritor e o impressor de suas próprias obras. Mas tinha, também, a preocupação do editor, no sentido bourdieusiano, de atuar como agente social com poder para consagrar objetos e distinguir pessoas. Neste sentido ele já tinha passado, naquele momento, pela experiência de idealizar e coordenar o consórcio editorial “Os Amigos do Livro” em que experimentou com êxito a função de atribuir valor a textos inéditos e a jovens escritores tirando os lucros simbólicos dessa operação (p. 204).
  • Assim, em 1939, quando o livreiro Paulo Bluhm, dono de uma livraria na Rua da Bahia, resolve ampliar os negócios abrindo uma filial e iniciando também as atividades de edição, é Frieiro que lhe prestará algum tipo de assessoria na criação da Livraria Editôra Paulo Bluhm. Sintomaticamente o nome da primeira coleção será Os Nossos, cuja proposta era dar à luz manuscritos de intelectuais mineiros, que aguardavam na gaveta a abertura do campo editorial local. (p. 205) [O brio do livro indica a presença do autor na tipografia e recebeu boas críticas ao longo do território nacional].
  • [A autora ainda cobre a conversa epistolar entre Frieiro e Ivan Lins que resulta, a despeito da irreverência de Frieiro, em alterações na segunda edição.]
  • [...] o editor da primeira edição com quem Frieiro tinha uma relação de confiança, havia se transferido para o Rio de Janeiro, após ter tido sua livraria depredada por populares da cidade, na onda de intolerância contra imigrantes alemães e italianos, associados indistintamente ao nazismo. (p. 209)
  • [Enfim, a segunda edição conta com]: [...] uma nota no verso da página de rosto informa que a presente edição aparece acrescida de nove capítulos, a saber: “Tristeza e alegria do bibliófilo pobre”, “O Diabo nas tipografias”, “Ainda o Diabo nas tipografias”, “O escritor e as provas”, “Corrigir provas”, “Lapsos, disparates e bernardices”, “Escritores impressores”, “A letra é sagrada” e “Tôda palavra impressa é um monumento a Gutenberg” [...] Porém, as alterações vão além dos novos capítulos. Embora não caiba no espaço deste artigo uma análise textual detalhada, o cotejo que fizemos entre a primeira e a segunda edição mostra que cada capítulo sofreu cortes e acréscimos que vão de um termo ou uma frase a páginas inteiras modificadas. Por exemplo: alguns estrangeirismos usados na primeira edição são traduzidos na segunda [...] Há mudanças tipográficas, [...] estilísticas, [...] e cochilos de impressão que passaram na primeira edição [...] são acertados na segunda. (p. 210-1).
  • "Na segunda edição o autor procura não apenas discutir questões contingenciais – o comércio de livros de segunda mão num difícil período de guerra mundial – como traz novas informações sobre certas questões que ele continuava pesquisando. Assim, se ao abordar as fontes bibliográficas a primeira edição só incluía manuais e repertórios portugueses e brasileiros, a segunda já traz fontes gerais francesas, italianas e espanholas. Do mesmo modo, as questões específicas do nosso país ganham destaque". (p. 211)
  • [...] na primeira edição o que hoje chamamos sumário é identificado como índice e aparece no final do livro, o que era comum nas edições da época. Na segunda edição o nome da seção passa a ser Tábua das Matérias o que, salvo engano, é tirado da tradição editorial francesa, e é mantida no final do livro. O elemento tipográfico que vem dar mais visibilidade ao conteúdo de cada capítulo é uma espécie de resumo escrito em tipos reduzidos, referente aos temas abordados ali, e que vem logo abaixo do título do capítulo. Este recurso introduzido na segunda edição será repetido em todas as quatro seguintes, embora publicadas por casas editoras diferentes. (p. 212) [A segunda edição também teve recepção crítica favorável].
  • Muita gente estranhou a falta da vírgula que, na intenção do autor, relativisa os sujeitos da frase. Nem todo livro merece a nossa leitura! Frieiro não abria mão dessa assertiva e segue perseguindo a ideia improvável de uma “edição definitiva” do seu livro sobre os livros. (p. 213)
  • [Segundo Carvalho, Frieiro tinha dificuldade em lidar com editores (inclusive recusava convites) o que dificultava a publicação da terceira edição, mas ela saiu a pedido de uma editora de São Paulo]: "O que há de singular na história de Frieiro é que, mesmo já dispondo de um capital cultural suficiente para ser disputado por editoras bem estabelecidas no mercado e que atuam na mesma linha editorial que lhe interessa pertencer, ele hesita em entrar no que Bourdieu chama de luta concorrencial" (p. 215)
  • A presente [terceira] edição, revista e aumentada, contém cinco capítulos novos: “O verdadeiro bibliófilo”; “Contra os livros”; “Santo Eça, mártir das tipografias”; “A indumentária do livro” e “Títulos de livros”. (p. 216)
  • O Capítulo Plano duma biblioteca mínima (para um leitor mediano),que figurava nas edições anteriores, foi suprimido nesta. Além do mais, das três edições, esta é a que chega mais perto daquilo que embalava os sonhos de Frieiro: “o livro pulcramente editado” sem os detestáveis (mas quase inevitáveis) erros tipográficos [...] Mas, nem mesmo esta edição satisfazia ao autor, embora a recepção dos críticos tenha sido, mais uma vez, muito positiva. (p. 217)
  • [Já na época de lançamento da terceira edição, Frieiro pensava na quarta. Entretanto]: A quarta edição só saiu em 1980, em comemoração aos 90 anos de Eduardo Frieiro, quando ele já quase não enxergava mais e estava distanciado das atividades que tanto deram sentido à sua vida: ler, escrever e editar. Foi publicada pela Coordenadoria de Cultura de Minas Gerias, dentro de um programa editorial que visava reeditar autores e livros expressivos da cultura mineira. Do ponto de vista de conteúdo não há, pois, nenhuma variação em relação à terceira edição, tida daí em diante como o texto estabelecido pelo autor; também não se destaca pelas artes gráficas, editado como brochura com miolo colado. O que há de significativo nesta edição é um longo prefácio, na verdade chamado de “Alguns Apontamentos” por quem o assina, o jornalista e escritor Moacyr Andrade. São nove páginas e meia de uma conversa saborosa retratando o amigo escritor e ex-companheiro de trabalho na Imprensa Oficial. (p. 218)
  • Uma quinta edição saiu em 1999 pela Editora Itatiaia, de Belo Horizonte, que havia negociado, muitos anos antes, diretamente com Eduardo Frieiro, os direitos de publicação de sua obra completa. É uma edição caracterizada por intervenções não autorais e, não obstante a tentativa dos editores de renovação do ponto de vista de produção editorial – brochura com orelhas contendo informações sobre o autor, capa de um artista plástico reconhecido, e ficha catalográfica – está marcada pelo excessivo número de erros tipográficos, o que teria desgostado profundamente a Frieiro, se vivo fosse. Aliás, cartas a amigos escritores já revelavam sua irritação para com os editores daquela Casa que, com o propósito de minimizar os custos de produção, vinham comprometendo a qualidade material dos livros publicados com a sua marca. Nesta quinta edição de Os livros nossos amigos mantém-se o prefácio de Moacyr de Andrade presente na edição anterior, mas suprime- se, sem razão aparente, a epígrafe escolhida por Frieiro desde a primeira edição, a frase de Proust La lecture est une amitié, e que, como convém a uma epígrafe no universo textual, desvela, sem escancarar, as intenções do autor sobre o modo como deseja ser lido. Nesse caso específico de modificação não autoral pensamos como Carvalho e Silva (1994) tratar-se de mais um caso de edições com erros e grosseiras deturpações, infelizmente ainda comuns no mercado de livros no Brasil. (p. 218-9)
  • A sexta, e até o presente momento última edição de Os livros nossos amigos foi publicada em 2007, em comemoração aos 10 anos de criação do Conselho Editorial do Senado Federal, aparecendo como volume 80 da coleção intitulada Edições do Senado Federal. A proposta de tal edição, conforme consta no verso da folha-de-rosto é buscar “editar, sempre, obras de valor histórico e cultural e de importância relevante para a compreensão da história política, econômica e social do Brasil e reflexão sobre os destinos do país.” Na quarta capa o livro de Frieiro é celebrado como “um hino de amor incondicional ao livro” e, ainda, como “uma apaixonada declaração de amor ao livro como objeto e como instrumento do pensamento humano.” O pequeno texto se fecha com uma indicação: “Para quem é apaixonado pelo objeto livro e pelo que ele acolhe não pode deixar de se deliciar com esta preciosidade de livro. Este também é um livro para os amantes do livro”. Sendo uma edição para marcar a trajetória de um núcleo editorial do Governo Federal, o resultado é, pode-se dizer, uma produção bem cuidada do ponto de vista material: capa elegante em papel cartão plastificado e miolo impresso em papel vergê areia, letras capitulares iniciando cada capítulo e nenhuma incorreção tipográfica. No que se refere à arquitetura do livro, ou à sua tectônica particular, segundo expressão do próprio Frieiro, a sexta edição se distingue das anteriores em alguns aspectos: emprega o termo Sumário para identificar as matérias do livro, trazendo-o para a página após a folha de rosto, como instrui a ABNT; promove o retorno da epígrafe suprimida na edição anterior e, o que teria, certamente, agradado ao autor, insere um índice onomástico de sete páginas e meia. (p. 219-20)
  • Dois aspectos, entretanto, relativizam a qualidade dessa edição: o primeiro trata-se da vírgula inserida no título – os livros, nossos amigos – que altera o sentido desejado pelo autor [...]; como segundo chama nossa atenção o tamanho reduzido, na capa e na lombada, da fonte usada para o nome do autor, obscurecido por outra informação que parece ser, na intenção do editor, a verdadeira autoria, a saber, Edições do Senado Federal. Ou seja, à maneira das primeiras produções da imprensa renascentista, nessa sexta edição de Os livros nossos amigos, o crédito de autoria da obra impressa quase se equipara entre o tipógrafo/editor que a construiu materialmente e aquele que concebeu o texto.
  • [Conclusão]: Do ponto de vista da sociologia de textos, seria problemático falar sobre “uma obra” como algo distinto e independente, da história de suas versões ou edições, podendo- se considerá-la, ao contrário, como algo instável, cuja expressão material estaria sempre permeável a novas intervenções autorais e não autorais. Entre o labor filológico para reproduzir o texto em sua forma original e os acidentes de percurso que a história da edição de um determinado texto desvenda, haveria uma relação de forças entre a necessidade de zelar pela integridade e fidedignidade do texto como expressão da cultura pessoal ou social e, como lembra McKenzie, a evidência de que cada versão reclama seu direito de ser editada à sua própria maneira, respeitando sua historicidade como uma realidade concreta. Mais do que nunca, o resgate do patrimônio cultural escrito é uma tarefa transdisciplinar que conclama os campos disciplinares da Linguística, Letras, História e Biblioteconomia. (p. 220-1).

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O Evolucionista Voador - Costa

Brown Sequard

TS - Jia Ye (2021)